.png)
Lastros Culturais




Grupo Folclórico SAIUG, atual Jadran
atuante desde 1950




Ao longo dos seus 1300 anos de história, a Croácia tem sido marcada por uma constante batalha para a sobrevivência, num ato de equilíbrio entre duas civilizações, a colisão de culturas e um esforço permanente para manter a identidade nacional. A trajetória croata até a independência se deu após uma longa luta pela emancipação política e cultural, tanto de países da região como daqueles mais distantes. O país, que desapareceu dos mapas europeus em 1102 após um acordo com a nobreza da Hungria, só reapareceu após sua independência em 1991. No Brasil, especialmente em São Paulo, os imigrantes croatas enfrentaram dificuldades devido à predominância de outras etnias, como italianos e alemães. Isso os levou a se adaptar e, em alguns casos, a se assimilarem, silenciando sua identidade em um contexto de desigualdade estrutural étnica. No entanto, muitos ainda mantiveram vivas suas tradições culturais, como a culinária, a dança e a música, que, mesmo em meio a um ambiente hostil, perpetuaram-se entre as gerações. Hoje, busca-se integrar essas memórias coletivas à história institucionalizada, aproximando a história croata da comunidade mais ampla e mantendo viva a herança étnica na São Paulo globalizada que recebe novos contingentes de imigrantes.
A música croata é uma rica expressão cultural que reflete as histórias e identidades do país, com raízes profundas nas tradições litúrgicas, nas canções populares e no uso de instrumentos como o tamburica (tradicional instrumento de cordas). Influenciada por diversos contextos históricos, como o domínio Austro-Húngaro e o contato com a Itália, a música croata também carrega a marca da luta pela independência. Quando os croatas imigraram para o Brasil, especialmente no final do século XIX e início do XX, trouxeram suas tradições musicais, como o já citado tamburica e o estilo klapa (canto a capella), que se tornaram um meio de resistência e de conexão com a terra natal. No Brasil, essa música se adaptou e se fundiu com ritmos locais, mantendo viva a memória cultural croata em festas, festivais e associações comunitárias. Nos encontros da comunidade, a música desempenha um papel de conexão cultural, (re)criando tradições e conectando diferentes gerações a uma memória coletiva que transcende fronteiras, como foi o caso da klapa Dalmati, atuante nos anos 2000. Assim, a música croata no Brasil é mais do que uma preservação folclórica, ela se torna um meio de criar diálogos interculturais, onde raízes antigas ganham novos significados, ritmos e formas, reafirmando a vivacidade de uma tradição que viajou pelo Atlântico e encontrou um novo lar. Danças folclóricas também mantêm vivas essas memórias, reforçando os laços culturais e familiares que muitas vezes atravessam gerações, como é o caso com o grupo Jadran.
A literatura croata tem uma longa e complexa história, ligada à preservação da língua eslava e à influência da Igreja Católica, carregando, consigo, séculos de história, resistência e conexão com o cotidiano, a oralidade e o regionalismo. Desde que chegaram ao mar Adriático, ainda sem habilidades de navegação, os croatas fixaram-se na região, preservando sua língua eslava com o auxílio da igreja católica, que permitiu o uso do antigo eslavo eclesiástico na liturgia, em vez do latim predominante na Europa. Este elemento linguístico foi um dos pilares na formação de sua identidade cultural. No século XIX, a breve presença napoleônica estimulou um movimento nacional(ista), encabeçado pelas elites locais, que buscava criar um alfabeto e identidades culturais próprias, culminando no Renascimento Popular Croata. As obras literárias frequentemente fazem referência a topônimos locais, o que pode parecer estranho para os leitores brasileiros, mas reflete a forte ligação da Croácia com suas cidades e paisagens. Além disso, muitos poetas croatas têm suas obras traduzidas, conferindo uma dimensão internacional à literatura do país. Ao apresentar essa literatura ao público brasileiro, é fundamental contextualizar sua rica tradição cultural e histórica. O acervo da Sociedade Amigos da Dalmácia, transformado em biblioteca em 1986, é composto principalmente por livros doados pela comunidade, pelo antigo consulado e outras instituições, com cerca de ¾ dos volumes impressos na antiga pátria e escritos nos idiomas da região, especialmente o croata. A maioria dos livros que compõe a biblioteca da SADA foi editada na Croácia, embora também haja publicações de outros países da antiga Iugoslávia. Além de livros em croata, o acervo inclui títulos em português, especialmente sobre o Leste Europeu, e obras sobre imigração, formando uma importante fonte de pesquisa sobre a experiência dos imigrantes, como, também, para o ensino e difusão da língua croata no Brasil.